segunda-feira, 21 de maio de 2012

Como fazer a coisa certa, para pecadores como você e eu


Post image for How to do the right thing, for sinners like you and me
Tendo crescido em uma família culturalmente tradicional (porém não religiosa), pecado não era algo em que eu pensasse muito. Quem lidava e falava sobre isso era o pessoal da igreja.
Mas, sim, eu pequei e continuo pecando. Hoje em dia, eu mesmo me vejo como uma pessoa que peca frequentemente, e estou trabalhando isso.
Para mim, esta palavra tem um significado diferente do que tem na cultura contemporânea. Quando criança, eu aprendi (e você também, provavelmente) que pecar é fazer algo realmente ruim. Se você pesquisar, verá que geralmente isso se refere a violar algum código de conduta religioso.
Então, por definição, se você não é religioso, você não tem como pecar, pois você não tem um código de conduta para violar.
Ainda assim, eu considero que este seja um conceito útil, mesmo para os não religiosos. Como mencionei anteriormente, eu penso que religiões são essencialmente metodologias de desenvolvimento pessoal que fugiram do controle. Elas são filosofias e mitologias destinadas a ajudar-nos a navegar a vida humana de forma a causar o menor dano possível, tanto para nós mesmos quanto para os outros. [Para uma explicação mais detalhada de por que eu penso assim, leia isso.]
Os infames "Sete Pecados Capitais" do Cristianismo, por exemplo, não são diferentes, em termos de objetivo, das proibições budistas de atos sexuais que causam danos, da mentira e do roubo. Todos se tratam de avisos claros que certos tipos de comportamento conduzem quase que invariavelmente ao sofrimento, seu e do próximo, portanto, se você não está a fim de sofrer, pode ser do seu agrado evitar de fazer tais coisas. O pecado bem definido existe para criar um sinal vermelho em sua mente nos momentos em que você está prestes a fazer algo prejudicial. Este sinal vermelho pode ser bastante útil como uma ferramenta que lhe permita tornar-se uma pessoa melhor.
A palavra, no entanto, se tornou um pouco carregada com o passar do tempo e acabou passando a ser utilizada exclusivamente para acusar outras pessoas, como vou explicar a seguir. Pecadores!
A palavra "pecar" tem sido mais comumente reconhecida como significando "errar o alvo". Não por fazer algo ruim por si só, mas por cometer um engano. Em termos modernos, talvez a expressão mais próxima do significado original de pecar seja "errar feio" [o texto original diz "fuck up"].
Não é preciso, no entanto, que a palavra venha acompanhada desta bagagem moral terrível, ainda que fique subentendido que você fez algo que causou algum prejuízo. E sempre que causamos prejuízo, pode-se afirmar que existe alguma questão moral em jogo em algum ponto. Moral não é nada além da consideração do dano causado por uma ação particular, certo?
Mas eu penso que, ao invés de definir pecado como algo "contra as regras", algo pelo que seremos punidos (por Quem ou O quê tenha sido que inventou estas regras), é mais útil pensar que o pecado seja uma transgressão moral contra nós mesmos.

Pecado diário

Nós todos causamos danos da forma como vivemos, em especial a nós mesmos. Nós reagimos às mesmas coisas todos os dias, em benefício de ninguém. Tráfego, longas filas, os hábitos de certas pessoas. Nós adiamos, mesmo quando aprendemos mais e mais que é muito mais fácil arregaçar as mangas e fazer acontecer.
Trata-se de uma ação bastante humana: prejudicar-se sem motivo. Eu me pergunto como outros animais fazem isso tão pouco. Como a noção de pecado surgiu como uma resposta à tendência óbvia do ser humano de causar danos, se descartarmos toda a bagagem religiosa, podemos utilizar o conceito de pecado em nossas próprias vidas para reconhecer aqueles momentos nos quais estamos prestes a fazer aquela coisa besta, aquela coisa ruim, ser preguiçoso, agir em autodefesa, e agirmos de forma diferente.
Cada um de nós é diferente, portanto nosso pecados comuns são diferentes também. Alguns dos meus pecados mais comuns são:
  • colocar tudo para fora quando não há uma razão inteligente para fazer isso
  • evitar interações nas quais eu corra o risco da dor social (como rejeição ou embaraçamento)
  • entregar-me ao gratificante comportamento risco zero, que não oferece nenhum benefício de longo prazo (tipo quando fico navegando indefinidamente na internet)
Talvez o seu pecado seja:
  • abrir a geladeira quando está entediado
  • dar o tratamento do silêncio ao seu parceiro quando você está frustrado com algo
  • deixar a louça na pia quando vai dormir
Pecados tendem a minar suas tentativas de se aperfeiçoar, modificar padrões, fugir da rotina. Estar atento sobre onde o pecado ocorre em seus ciclos comportamentais é como encontrar a chave certa para o parafuso, aquele lugar do qual você pode se libertar e não voltar mais. Conhecer seus pecados é um solo fértil para grandes avanços na vida.
Os pecados religiosos tradicionais tentam resumir todos estes comportamentos de autodefesa a categorias muito mais gerais de comportamentos do tipo "não-não", geralmente definidos por palavras isoladas, tais como "ganância" ou "orgulho", mas estas palavras não costumam nos dar pistas suficientes sobre de que outra forma podemos lidar com as coisas. Eu penso que, se queremos mudar significativamente nossas vidas, consequentemente pecando com menos frequência, precisamos ser mais específicos e mais pessoais.

Quem é, de fato, o Diabo?

Eu sei que um dos meus pecados perpétuos é convencer a mim mesmo que eu posso me exercitar amanhã ao invés de hoje. A desculpa é sempre a mesma mentira escorregadia – minha ginástica diária é curta e intensa e eu poderia tranquilamente fazer duas sessões em um dia, então eu posso tranquilamente deixar de fazer hoje e fazer amanhã. É claro que, no dia seguinte, novamente não quero me exercitar e isso acaba sendo duas vezes mais tentador, porque eu tenho que fazer duas sessões, não uma. Então caio num círculo vicioso.
É quase como se eu tivesse um lado mal, um sacana tentando destruir tudo que é bom e virtuoso. Não é sem sentido tentar dar um nome a este sacana. Que tal "Satã"? Ele me sacaneia e me faz pecar. Às vezes eu acredito que ele não existe e é justamente nesta hora que ele é mais perigoso.
Seria bastante lógico e fácil projetar uma narrativa religiosa sobre tudo isso. Você poderia considerar a parte medrosa, enganosa da sua mente como se fosse o Diabo. Você poderia considerar que a parte virtuosa, intuitiva e não reativa da sua mente como se fosse Deus. E poderia ver suas lutas pessoais como conflitos entre o bem e o mal.
Pecar nos permite experimentar a mesma dor repetidamente, enclausurando-nos em um ciclo de dor que se manifesta na vida das pessoas como Inferno. O Inferno do vício, o Inferno do autodesprezo, o Inferno do adiamento.
O inferno é o que você cria quando peca. Não é um lugar para onde você vai quando morre, caso tenha chegado ao fim da sua vida uma pontuação baixa. Estou convencido de que o Inferno, descrito pelos sábios autores das escrituras religiosas, não é nada mais do que ciclos de sofrimento pessoais e autocriados. E se você alguma vez experimentou a agonia de se contorcer na grande dor (que você tem) em um ciclo de vida, então você sabe se isso pode ou não ser considerado um Inferno.
Eu não acho que estas narrativas mitológicas sejam um quadro tão irracional de se pintar, mas aí corremos o risco de transformar a coisa toda num desenho animado, fazendo destes conceitos úteis, entidades concretas que supostamente lutam fora de nós, no mundo em geral.
Mas, mesmo que essa guerra seja real, o único ponto de influência que você tem nela – e, portanto, o único ponto que considera importante – é como você se conduz. E é isso que toda religião sempre foi. Os nomes, os eventos, as fábulas, a criação das histórias – tudo isso são apenas alegorias e cenografias para ajudar o ser humano a entender como viver sem acabar no Inferno.
Em outras palavras, ver o pecado como qualquer coisa menos como algo importante para sua conduta é uma válvula de escape para longe da sua responsabilidade pessoal. Você pode desviar o holofote de si mesmo, desviar do sofrimento que está criando, concentrando-se em falhas comportamentais dos outros.
E isso nos proporciona uma sensação extraordinária de alívio – poder sentir-se bem consigo mesmo por um momento, porque você vê que outra pessoa está pecando de forma muito pior. Pense nisso. Todos nós temos nos impelido a fazer certas coisas a vida toda! É uma batalha que dura a vida toda e não temos muitas folgas, exceto quando nos preocupamos com os erros que os outros estão cometendo.
É muito mais fácil e muito mais atraente zombar dos "pecados" dos outros, do que concentrar-nos em superar nossos próprios demônios, e penso que em algum ponto isso acabou se tornando um tema mais proeminente na prática espiritual do que autorreflexão e autodesenvolvimento. O pecado passou a significar julgamento, ao invés de crescimento pessoal.

Conheça seus pecados

Todas as religiões têm sua lista de pecados. Há certos comportamentos que parecem ser insensatos – universalmente – para qualquer um que não goste de sofrimento. Ganância, preguiça, inveja, luxúria, raiva e assim por diante. Você sabe o que são. E eles são reais, geralmente. A maioria das pessoas é propensa a machucar a si e aos outros por entregar-se à ganância, inveja, luxúria, gula ou os outros.
O problema é que eles são muito genéricos e não existe um ponto claro no qual se possa aplicá-los ao seu comportamento. Quando vou a qualquer lugar onde há um monte de pessoas num dia quente de verão, eu verei dúzias de belas mulheres vestindo blusinhas e minissaias. Eu experimentarei sentimentos de luxúria. Estou pecando? Estou ferindo a mim ou a outros? Onde está o perigo? O que eu deveria fazer?
Talvez haja algum perigo aí (especialmente se houver uma barraquinha vendendo cerveja). Eu poderia fazer alguém se sentir desconfortável ou inseguro, olhando para seu decote. Eu poderia pisar nos calos de alguém, caso flertasse com uma mulher já comprometida. Eu poderia perder o juízo e me entregar a um encontro sexual impulsivo que causaria um sofrimento enorme para minha namorada ou esposa. Fica claro que vale a pena reconhecer a força que sentimentos lascivos têm, pois isso lhe permite evitar danos que podem ser causados em decorrência deles.
Mas, se um pecado é descrito para mim por um livro sagrado como simplesmente "Luxúria", não há forma de eu saber como proceder, uma vez que o perigo parece estar em todo lugar. Em algumas culturas, os homens insistem que as mulheres não possam exibir seus corpos, pois, se o fizerem, estarão provocando comportamentos pecadores. Portanto elas devem vestir sacos de pano.
Isto é insano e é o que ocorre quando a ideia de pecado deixa a esfera da responsabilidade e reflexão pessoais, passando a uma instância de dogma – onde toda reflexão sobre o por que é considerada como já tendo sido tratada há séculos. A autoavaliação sobre como se deve viver jamais deveria ser considerada "finalizada".
"Reconhecer meus pecados", neste caso, pode significar estar ciente de que flertar com alguém pode não representar perigo, mas sexo sem proteção é definitivamente algo que possibilita ferir a mim ou a outros. Se eu pratiquei tal transgressão no passado, devo pensar sobre onde exatamente eu posso sentir a tentação de pecar e sobre o que fazer para evitar isso.
Os pecados aos quais cada um de nós está suscetível são diferentes. Para você, pode ser apertar o botão "soneca" nove vezes e não ir meditar de manhã. Para mim, pode ser visitar o Reddit enquanto tomo meu café da manhã, ao invés de preparar um almoço para levar ao trabalho.
Cada pecado tem uma hora da verdade, na qual você tem uma chance de se salvar. Ao invés de apertar o botão "soneca" pela segunda vez, você se senta e coloca os pés no chão, antes que o Diabo assuma o controle. Ao invés de clicar em mais um link interessante/enfurecedor, eu fecho a tela do laptop e vou pegar o tupperware.
Eu não estou sugerindo que você se sente e comece a inventariar todos os seus pecados, depois faça uma lista dos "Dezesseis pecados capitais do Fred Smith". Você precisará ser capaz de reconhecê-los conforme forem acontecendo. Você deve saber identificar aquele momento em que você pode fazer a coisa errada, novamente.
Você precisa descobrir como agir de forma diferente. Assim que descobrir, para colocar em prática, só precisa mover seu corpo, ainda que não seja o que você quer fazer. Sente-se, coloque os pés no chão.
Saber o que seu corpo deve fazer neste momento é crucial. Então você só tem que se atirar de corpo nisso e deixar para trás aquele momento de tentação, ou então o Diabo encarnará em você. Na hora da verdade, quando percebo que estou tentando me convencer a adiar minha ginástica, eu sei que preciso tirar as calças, afastar a mesa do café, pegar o kettlebell e começar o aquecimento.
Mexa seu corpo antes que o Diabo o faça e nunca deixe que ele o convença de que você não é um pecador também.
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Foto de Isidr Cea
Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.

segunda-feira, 14 de maio de 2012

Não importa quem você é, mas o que você faz


Na semana passada, pedi que os leitores respondessem à questão “Onde você se encontra neste momento em sua vida?” Incluindo e-mails, houve algo em torno de 200 respostas até agora. Veja-as aqui (em inglês ou aqui, em português).

Cada pessoa parece estar bem no meio de uma história bastante dramática. Alguns temas emergiram. Diversas pessoas disseram que se encontram em um momento difícil ou de indecisão, incertas sobre qual direção devem tomar. Muitos outros parecem ter passado de um estágio da vida para outro que é novo e nada familiar – se formaram, acabam de terminar uma relação, sofreram uma tragédia.

Parece haver uma alta e desproporcional incidência de preocupação e incerteza. Mas talvez isso seja mais normal do que pensamos. Estes momentos pesados parecem ser exceção enquanto os vivemos, uma vez que mal podemos esperar para voltarmos a nossa vida normal, isto é, para o que geralmente imaginamos que seja normal.

O normal, no entanto, pode ser uma miragem. Quando você vai ao encontro de algum conhecido em uma festa ou algo assim e lhe perguntam como você está, o que você está fazendo, você provavelmente tem uma tendência a “normalizar” a resposta – “Ah, eu continuo trabalhando na [empresa X], jogando tênis uma vez por semana agora, planejando viajar para o Havaí. Está tudo bem.” Você provavelmente deixará de fora qualquer angústia que sinta sobre o momento que está vivendo em sua vida, sobre como você realmente está, sobre para onde você pensa que está dirigindo seus esforços, mesmo que estes pensamentos signifiquem boa parte da vida da maioria das pessoas.

Se você leu todas as diferentes percepções destas pessoas sobre onde elas realmente estão em suas vidas, drama e incerteza são normais, se é que normal tenha mesmo algum significado.

Ainda que eu pense que tenho uma ideia melhor agora, eu geralmente sou egoísta em acreditar que estou praticamente “dobrando a esquina” para finalmente entrar na estrada reta da minha vida. É um tipo de neurose que parecemos ter – a ideia de que existe um ponto a ser atingido na vida a partir do qual não haverá mais nada significante pendente de ser resolvido. Bem, eu acho que esse dia realmente existe: o do nosso enterro. A condição humana pode ser gerenciada, mas não existe uma cura real. Esta pode ser uma notícia fantasticamente libertadora se você estiver pronto para esquecer a ideia de finalmente dobrar a esquina algum dia.

Há, no entanto, avanços a serem feitos. Algumas vezes quando eles acontecem, você sente como se fossem “A Resposta”, mas a euforia se vai quando você se depara com a próxima crise de problemas. Eles podem alterar a sua trajetória de vida, fazendo com que você mude de maneira permanente a forma como lida com as coisas e fazendo com que você nunca mais sinta um determinado tipo de dor. É como se você “passasse de fase” em termos de habilidades em qualidade de vida.

Avanços tendem a vir na forma de tapas na testa, quando você se dá conta que tem sido o causador de seus problemas durante sua vida toda, e você se dá conta que não precisa mais continuar fazendo isso. É bem comum que isto aconteça por meio de uma simples percepção através de algo que você leu ou ouviu alguém dizer.

Após um grande avanço, problemas familiares podem passar a ser vistos de outra forma, deixando de atingir você realmente como problemas. Você pode fazer com que esta nova perspectiva se torne presente em todos os momentos crônicos da sua vida e talvez esta seja a solução do momento, ou talvez não. Mas as coisas serão diferentes.

Eu tive um avanço recentemente que explica uma grande parte dessa dificuldade aparentemente desnecessária que eu tinha na vida. Acho que pode ser relevante para alguns de vocês.

Esforço, explicado


Antes de mais nada, quero deixar claro que não culpo ninguém pelo que aconteceu comigo. Ninguém tentou me prejudicar.

Quando criança, eu demonstrava um talento e uma inteligência excepcionais e eu sempre era elogiado por isso. O problema é que inteligência e talento natos não são coisas que se possa adquirir. É um lance de dados.

A criança que se acostuma a ser enaltecida por coisas que ela alcançou começa a entender que seu sucesso é uma condição de “como as coisas são”. Ela terá sucesso porque ela é quem ela é, não porque ela faz o que faz.

O leitor e também blogueiro Brian Kung publicou um artigo há algumas semanas, identificando a situação como um fenômeno relativamente comum, dizendo que há problemas comportamentais já bem conhecidos na vida adulta de pessoas que, quando crianças, foram enaltecidas exclusivamente por seus talentos.

Conforme eu lia a lista de consequências típicas, comecei a sentir frios na barriga. Era eu. Talvez seja você também.

No fim das contas, a criança acaba associando sucesso e fracasso com traços de personalidade natos e imutáveis, ao invés de entender isso como comportamentos que funcionam e não funcionam. Ela se torna extremamente avessa a correr riscos porque não quer fracassar em algo que faça e passe a ser vista como “burra” ao invés de “esperta”.

Ela fica com medo do fracasso e da rejeição porque acredita que a incidência de fracassos ou rejeições sejam evidências diretas de que ela seja um fracasso ou uma rejeição. Ela evita desafios porque desafios sempre representam uma possibilidade de “se tornar” um fracasso.

Ela não consegue lidar com críticas, porque percebe isso como um desafio a quem ela é, não à forma como está fazendo alguma coisa no momento.

Ela se sente ameaçada pelo sucesso dos outros. Ela não consegue lidar com a perda, então evita competir.

Depois de anos com este tipo de sentimento acompanhando conquistas e objetivos, ela começa a sentir o mundo como determinístico e que esforço extra não substitui a capacidade intrínseca de alguém.

Isto explica tudo. Explica por que eu nunca me inscrevi para intercâmbios, por que deixei de praticar esportes, por que nunca tentei seguir uma carreira que eu pensava que poderia adorar, por que evitei encontros, por que sempre usei roupas sem graça, por que eu costumava sentir medo até de pedir uma pizza, pois poderia me perder no pedido e me sentir envergonhado.

Ela “pode chegar a um determinado patamar muito cedo e não atingir todo o seu potencial.”

Fiquei muito feliz de ler isso. Mais uma vez: não posso culpar os adultos da minha vida pelos encorajamentos que me deram. Ninguém de nós poderia saber dos bizarros efeitos colaterais. O importante é minha percepção de ter tido uma revelação sobre algo que pesava em mim durante a vida toda e isto me deixa entusiasmado para viver o resto dela.
Percepção não basta

Uma percepção por si só, no entanto, não muda a forma como vivemos nossa vida. Ela deve se manifestar como uma mudança comportamental para que a vida mude, e isto não acontece de forma automática. Para mim, isso remete a reduzir a percepção a um mantra ou aforismo, que seja o gatilho para agir de outra forma nestes certos momentos em que você está prestes a cometer seu erro cotidiano.

A revelação foi esta:

Não importa quem você é, mas o que você faz.

É isto que tem me vindo à cabeça sempre que eu percebo que estou levando algo para o lado pessoal. Sucesso e fracasso dizem respeito apenas à validade das ações, não às personalidades. Isto fará alguns bocejarem – eles já vêm lendo coisas parecidas em pôsteres de motivação e em biscoitos da sorte desde sempre. Pois eu também, mas não entendia o significado.

Todas as vezes que eu fracassei, não via outra explicação senão a de que o fracasso fora uma consequência de quem eu era. De alguma forma, eu acreditava que todas as vezes em que fui bem sucedido, isto fora uma consequência direta de minhas qualidades natas e não do meu comportamento usual, então meus fracassos também deveriam seguir a mesma linha de raciocínio. Se eu estragava alguma coisa, não havia a possibilidade de eu apenas ter escolhido fazer algo que não era o mais apropriado, mas tratava-se de uma falha pessoal.

Eu nunca fui responsável por qualquer um deles, sucessos ou fracassos. Somente o mundo em geral poderia me entregar uma ou outra. O mundo em geral optou por chutar meu traseiro.

Se eu não conseguia um emprego, era porque eu era inadequado, e não porque eles apenas não ouviram de mim o que queriam ouvir.

Se eu era rejeitado por uma garota, era porque havia algo errado comigo, não porque naquele momento minha estratégia de aproximação não a intrigou por alguma razão.

Se eu sempre vivi em apartamentos chatos e monótonos, é porque eu sou uma pessoa desinteressante, não porque eu nunca tracei como objetivo ter uma casa como eu gostaria e em uma vizinhança em meio a qual eu desejasse estar.

A diferença entre pessoas que sofrem deste tipo de “determinismo de personalidade” está em entender que você pode usar outra abordagem da próxima vez, e este sempre será o único ajuste necessário.

“Quem você é” é sempre o suficiente. Você sabe que conseguirá da próxima vez ou na seguinte porque você pode tentar algo diferente. Eu sempre assumi que, se eu fracassei em alguma coisa, eu deveria ser outra pessoa para que fosse possível eu ser bem sucedido.

Que inacreditável erro de cálculo! É o que você faz, não quem você é! E eu venho fazendo isso errado por toda minha vida. Talvez você não, mas se isto lhe soar familiar, as coisas podem estar próximas de mudar muito.

Eu estava vivendo ao contrário. Descobri que quem eu sou determinava o que eu faria ou poderia fazer. Por causa de quem eu era, eu não podia fazer X, então sempre tinha que fazer Y. Isso é o que eu era. Acontece que o que eu faço pode mudar a qualquer momento e isto tem um efeito direto na modificação do meu eu. Eu nunca dancei porque eu nunca fui uma “pessoa que dança”. Agora parece óbvio para mim que, tão logo eu dance, apesar da pessoa que eu penso ser, eu rapidamente me torno uma pessoa que dança. É assim que pessoas que dançam se tornam pessoas que dançam. Elas dançam.

Em outras palavras, são os comportamentos que resultam na personalidade, não a personalidade que resulta nos comportamentos; e esta, para mim, é uma revelação que não tem preço.

Isso significa que a personalidade é extraordinariamente maleável, contanto que você não esqueça de que, não só pode fazer o que não é do seu feitio, como fazer o que não é do seu feitio é o único caminho para o crescimento.

Ainda assim, todos nós gravitamos em direção ao confortável, o que equivale a gravitar em direção ao que não nos ajuda a crescer.

De qualquer forma, vejo tudo de forma muito clara agora. Objetivos há muito esquecidos parecem frescos novamente. Eles vão acontecer. Minha personalidade não me limita mais, porque eu vou ignorá-la. Eu farei o que não é do meu feitio e surpreenderei as pessoas que melhor me conhecem. Vou surpreender a mim mesmo.

Mais uma vez, eu sei que existem pessoas que nunca tiveram este problema. Elas estabelecem objetivos de forma confiante, sabendo que serem quem são, não as limita, e que fracassar significa tão somente que o que elas fizeram não era o que iria funcionar.

Ainda assim, eu sei que alguns de vocês sentiram o clique. Suspeito que muitos, até mesmo a maioria de nós, pensa que nossas personalidades são esquemas muito rígidos e que não nos permitem fazer muitas coisas que queremos. Então eu espero que você faça algo que não é do seu feitio hoje e veja se entende o que eu quero dizer.

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Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.

segunda-feira, 7 de maio de 2012

É segunda-feira novamente. Você sabe onde está?

Post image for It’s another Monday morning, do you know where you are?
Não não tenho tatuagens, mas sempre as amei nos outros. Apenas ainda não encontrei nada que eu tenha certeza que quero na minha pele pra sempre. Um mochileiro inglês que conheci, que tinha dúzias de tatuagens, me contou enquanto tomávamos um chá que ele adora as suas porque cada uma o faz lembrar do momento em que estava na sua vida quando ele a fez.
Tentando não ser rude, eu perguntei por que ele achava necessário que cada uma das suas lembranças fosse uma característica permanente do seu corpo.
Ele me respondeu dizendo que não havia nada mais importante para ele do que nunca esquecer que sua vida já foi completamente diferente do que é agora e que foi real. As tatuagens o fazem lembrar que o agora é real, ainda que a vida parecerá muito diferente para ele quando olhar as tatuagens um ano depois de tê-las feito.
“Se eu vou realmente me permitir curtir a vida e não me estressar, eu preciso ao menos saber disso”, ele disse. “Que eu já tive muitas vidas e ainda tenho muitas para viver”. Eu não entendi bem e ele parecia sentir aquilo, até que finalmente o pensamento certo apareceu: “Minhas tatuagens me fazem lembrar que estou aqui.”
Há um ano atrás, eu fiz uma pergunta sobre você e a resposta me surpreendeu completamente. Eu quis saber em que momento da sua vida você está agora, em qual “momento do tempo” você está e como chegou até ele.
O meu momento naquela época parece tão diferente se penso nele hoje, inclusive onde estou fisicamente, o que passa pela minha cabeça, o horizonte que vejo e o que ficou para trás.
Me fascina o fato de todos nós sermos tão complexos e ainda assim é tão raro que saibamos nas próprias palavras de alguém onde este alguém encontra em sua vida neste momento. Cada um dos que caminham pelas ruas tem uma ideia completa e uma história para o momento em que se encontram e é algo totalmente misterioso para nós. Exceto agora, se você dividir conosco.
Então diga-nos: onde você está agora? Como você vê seu momento no tempo?
Adoraria ser atualizado por qualquer um dos que tenham postado da última vez, como também novas histórias.
Conforme falei da outra vez, proceda da seguinte maneira:


Tire os olhos da tela por um momento. Pare de ler por meio minuto e olhe para as pessoas e objetos ao seu redor neste instante. Tente ter uma boa visão do cenário em que está e do tom emocional que está presente. Assim que terminar, continue lendo.
(Faça isso agora.)
Certo, então você está aqui. Primeiramente, onde é “aqui” neste momento, fisicamente falando, e como você chegou a este ponto da sua vida? Como você sente o hoje?
O que está na sua mente? O que é realmente grandioso para você agora? O que é que não sai da sua cabeça? Tudo bem se quiser fazer associações livres.
Para onde você sente que a vida está apontando neste momento? O que está para acontecer? O que parece estar tornando sua vida excitante neste momento?
Mesmo se você não tem o costume de fazer comentários, por favor, faça isso.
Dividirei o meu também mais adiante.

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Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.

terça-feira, 1 de maio de 2012

Como fazer trilhões de dólares

Post image for How to Make Trillions of Dollars
Antes de iniciar, devo dizer que não recomendo que você faça isso. Vou compartilhar esta estratégia apenas para fins de informação, para que você possa entender o tabuleiro do jogo com o qual está trabalhando e possa fazer escolhas pessoais melhores sobre como ganha e gerencia seu dinheiro.
Eu aconselho você a ser um milionário, se isso lhe interessar. Se é atrás de bilhões que você está, acho um tanto suspeito, mas lhe darei o benefício da dúvida. Aspirar fazer trilhões, no entanto, é estar no domínio apenas dos perversos e não poderemos mais ser amigos.
O dinheiro gordo não está na criação de produtos, mas na criação de consumidores. Um único consumidor vitalício, que passe a vida gastando da forma que você quer que ele gaste, vale seis ou sete dígitos. Um único. Criar milhões destes é a única forma de fazer trilhões.
Você pode fazer milhões vendendo um produto ótimo para pessoas que precisam dele, mas você faz bilhões e trilhões condicionando uma nação inteira de pessoas a reagir a cada inconveniente, cada capricho e cada desejo passageiro ou medo, comprando alguma coisa.
Sim, isto requer algum capital para funcionar. Você não conseguirá gerenciar o negócio com assistentes virtuais estrangeiros, trabalhando a 5 dólares por hora, mas, como eu falei, eu preferiria que você não lutasse para ser um trilionário, pois isso não é algo bom para o restante de nós.
É necessária uma mudança cultural engenhosa. Um pequeno empresário jamais conseguiria gerenciar isso, mas, se você tem algum dinheiro velho sobrando (e alguém sempre tem), então você está em posição de influenciar ou comprar emissoras, políticos e figuras prestigiadas nos meios de comunicação, e você pode estabelecer um novo normal bem rapidamente.
Após a Segunda Guerra Mundial, alguns poucos americanos privilegiados desenvolveram uma fórmula brilhante para construir uma economia enorme e inimaginável:
[Nossa economia] demanda que façamos do consumismo nosso estilo de vida, que convertamos o comprar e o uso de bens em rituais, que procuremos nossas satisfações espirituais no consumismo. A forma de medir status social, aceitação social, prestígio, passará a ser encontrada em nossos padrões de consumo […] Precisamos que as coisas sejam consumidas, queimadas, desgastadas, substituídas e descartadas de forma regularmente crescente. Precisamos que as pessoas comam, bebam, vistam, dirijam, vivam, de forma cada vez mais complexa e que, consequentemente, tenhamos um consumismo que se expanda constantemente e que custe cada vez mais caro.
~American retail analyst Victor Lebow
Isto é marketing de nível muito elevado, e é o que compõe grande parte do mundo desenvolvido ao seu redor.
Usando a televisão como sua ferramenta principal, marqueteiros de nível muito elevado conseguiram criar uma nação que tipicamente:
  • trabalha praticamente o tempo todo
  • absorve diversas horas de comerciais todas as noites, em sua própria casa
  • está cansada e doente, e vagamente insatisfeita com sua vida
  • responde ao tédio, à insatisfação ou ansiedade apenas comprando ou consumindo coisas
  • tem rendimento disponível, mas não consegue encontrar uma linha mais gratificante de trabalho sem perder seu seguro de saúde
  • cria problemas de saúde para si, os quais podem ser tratados com drogas sobre as quais pode “solicitar informações ao seu médico”
  • possui muito mais coisas do que pode utilizar, e acredita não ter o suficiente
  • é facilmente distraída sobre o estado doente em que se encontra sua vida pelas últimas notícias e fofocas sobre celebridades
  • se convence perpetuamente que não é o momento certo para mudar significativamente seu estilo de vida
  • compra alegremente coisas que estragarão em menos de um ano, e que ninguém sabe consertar
  • aprendeu, por meio da cultura da mídia de responsabilizar culpados, que a chave para resolver questões públicas e privadas é encontrar a pessoa certa para odiar
Não que isso seja drasticamente diferente no restante do mundo desenvolvido. Trilionários (ou pelo menos os empregados deles) estão trabalhando contra o relógio para transmitir estes hábitos para as salas de estar em toda parte. Economia enorme, população enorme, influência global.
Pessoas saudáveis – que sabem lidar com frustração, que desistiram da ideia de balas mágicas, que não assistem TV indiscriminadamente, que se sentem satisfeitas com coisas que não custam dinheiro – não são consumidores em potencial, portanto os marqueteiros de nível muito elevado têm alimentado uma cultura que produz exatamente o oposto.
Você está sendo incentivado, virtualmente a partir de todos os ângulos, a se tornar ou permanecer doente e não realizado, porque desta forma você comprará mais. Não é para que você fique paranoico, mas este é o principal objetivo do retângulo brilhante em sua sala de estar – incentivar uma saúde pobre (mas não completamente falha), uma complacência geral e um reflexo inconsciente para torrar dinheiro.
Este não é um grito de guerra para atear fogo no Wal-Mart mais próximo. O anti-capitalismo clichê é coisa de garotos de ensino médio.
Não estou nem dizendo para você atirar sua TV pela janela. Mas este é sem dúvida um movimento de ROI (custo-benefício) muito elevado, caso esta ideia lhe interesse.
Eu nem mesmo recomendo que você nutra ódio pel'O Homem. De fato, é um eufemismo dizer que isso seria estar latindo para a copa de árvore errada. Não há nada lá fora – nenhuma ideologia, metodologia, comportamento ou ideia de alguém – que seja saudável odiar. O Homem faz o que faz porque não sabe fazer nada melhor – ele mesmo é um viciado, com habilidades de vida pobres.
Suas habilidades de vida podem ser transformadas em habilidades superiores, as quais o protegerão de sucumbir aos impulsos destrutivo e auto-destrutivo, tais como (entre outros) o impulso de criar uma cultura de saúde doente, medo e vício, só para você poder curtir sensações exclusivas como a de vestir uma cueca de 10.000 dólares, ou negociar companhias como se fossem cartões de beisebol.
De fato é um Homem triste o que não consegue ter uma vida confortável sem levar centenas de milhões de pessoas ao chão, para tornar mais fácil obter o que está em sua carteira. A esta altura, ele [O Homem] nem mesmo consegue mais voltar atrás – ele já apostou todas as fichas, como dizem.
Então não odeie O Homem, pois isso apenas deixará você mais fraco e distraído do que pode realizar se não seguir suas pistas. Ódio tem um custo-benefício terrivelmente pobre, pelo menos no que diz respeito a qualidade de vida. Se você tem alguma raiva e sente que precisa algum “investimento”, pratique algum esporte de raquete. Direcione sua raiva para longe de qualquer pessoa ou animal e, quando seu ataque de cólera tiver terminado, direcione sua energia para o cultivo de habilidades de vida.
Eu não me refiro a habilidades de vida específicas para situações cotidianas, como trocar pneus, costurar botões de camisa ou abrir portas de banheiros públicos sem tocar na maçaneta, ainda que estas também são certamente úteis.
Aqui, eu me refiro a fundamentos reais sobre ser um ser humano poderoso e auto-direcionado.
Criatividade. Curiosidade. Resistência à distração. Paciência com o próximo.
E, para tornar tudo isso possível: autoconfiança – uma vontade inabalável de assumir responsabilidade pela sua vida, independentemente de quem tiver contribuído para que ela se tornasse o que é hoje.
Cultive estas qualidades em você e nos outros e, quando este estilo de vida se tornar mais normal do que adotar as dicas de estilo de vida de propagandas de descontos em lojas e da CNN, a estratégia trilionária infalível parará de funcionar. Para qualquer um.
Mesmo que parta de um local aparentemente inofensivo – um apartamento médio em algum canto esquecido da sociedade que foi concebido para deixá-lo doente e impotente – estas características farão mais por você do que qualquer postura “Anti” que você possa imaginar. Odiar o sistema é o passatempo americano preferido. É uma sensação boa, é difícil de parar quando você começa e o conduz a precisamente lugar nenhum, de forma não muito diferente do que comer Doritos.
Não se trata de nós contra eles, mas de nós por nós.
Embora O Homem seja em muitos aspectos imaturo, ele tem, sim, muito dinheiro e suas estratégias estarão na sua frente em todo lugar.
Ele projetou seu estilo de vida, desde os anos que você gastou em um emprego que não tem nada a ver com suas paixões, até o anúncio da Ford que você olha fixamente enquanto urina num mictório na Applebee, até o seu tocador de DVD que durou apenas 30 dias a mais do que sua garantia, até o caminho fácil entre seu micro-ondas e seu sofá.
As estratégias para se tornar trilionário que você encontra são tão traiçoeiras pelo fato do quão normais elas se tornaram. Você as encontrará se infiltrando na sua vida não apenas de forma explícita, em revistas e comerciais, mas implicitamente, na forma como as pessoas ao seu redor – até mesmo pessoas que você ama – esperam que você viva.
Você terá que ser incomum. Espero que você já seja.
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Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.