segunda-feira, 25 de junho de 2012

Qual é o seu problema?

Olá, amigos. É verão e eu estou indo voar novamente. De volta à minha cidade favorita para ver algumas das minhas pessoas preferidas e curtir o aniversário das minhas duas nações favoritas. As noites fugazes durante esta semana serão gastas no artigo da semana que vem (sei que já disse a alguns de vocês do que se trata), então hoje tenho apenas uma pergunta para vocês.
Sempre que pergunto algo à audiência, mesmo que seja apenas o que está acontecendo, fico comovido pela resposta. Por trás de cada um dos nomes na seção de comentários, está uma vida vasta e se desdobrando ativamente, e todos nós vemos muito pouco dela, normalmente. As histórias são sempre tão coloridas e atraentes, muito mais interessantes do que a ficção.
Também adoro a forma como os que comentam começam a se comunicar com os outros, ajudando-se mutuamente. Adoro que um grande contingente de pessoas com pensamentos (em sua maioria) semelhantes se reúna aqui regularmente.
Eu quero saber:
Qual tem sido a parte mais difícil para você?
Da vida, quero dizer. Não me refiro ao período mais difícil da sua vida, mas sim ao tema recorrente que sempre tem lhe causado tristeza, especialmente se você sente que a maioria das pessoas não tem problemas com isso.
Suas respostas e histórias são sempre muito úteis para mim, e para outros leitores também. Eu frequentemente acabo esquecendo o quão complexa é a história de todo mundo, e sempre que isso acontece, meus problemas aparentam ser o grande drama do mundo para mim. E isso não é bom para ninguém. Quando outras pessoas se abrem, isto nos dá uma perspectiva sobre cada uma de nossas próprias sacolas de martelos [do inglês "bag of hammers": gíria com significado aproximado de "estupidez"].
Desabafos são totalmente bem vindos, mas este realmente não é o objetivo. Eu quero especificamente ver as pessoas se expressarem sobre a área (ou questão específica) na qual se sentem mais bloqueadas. Ao longo da minha vida, eu permiti que certos problemas se agravassem, até mesmo por anos. Recentemente eu fiz grande progresso em certas questões vitalícias, e a quantidade de ação necessária para que houvesse uma mudança foi incrivelmente pequena.
Tudo que realmente precisei para começar a mudar as coisas foi finalmente expressar o problema para outra pessoa, em palavras. Existe algo mágico nisso. Estou pedindo que você faça isso aqui, mesmo que não tenha o costume de comentar.
Diga-nos. Qual é o seu problema?
***
Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude, realizada por Alexandre Heitor Schmidt.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Por que f*demos

Um pensador profissional chamado Thomas Hobbes manteve por muito tempo em nossas cabeças a ideia de que nossos ancestrais foram pessoas patéticas, solitárias e medianas.
Um século e meio depois, Hobbes ainda é reverenciado por sua inteligência, ainda que sua fama estará para sempre mais ligada a sua infeliz afirmação de que a vida do homem pré-histórico era "solitária, pobre, sórdida, embrutecida e curta".
Atualmente, apenas poucos cientistas continuam empunhando a bandeira do "embrutecida e curta". Mesmo que a imagem do homem das cavernas paranoico, mudo, violento e solitário ainda persista na cultura pop (e algumas vezes em postagens mais antigas deste blog), há poucas evidências que apoiam esta linha de pensamento.
Já sabemos que o ser humano sempre foi uma criatura altamente social e foi esta característica que definiu a força de nossa espécie. Sabemos que os humanos foram nômades por praticamente toda sua existência, vagando em grupos de 50 a 150 indivíduos. Ao invés de estressados, violentos e solitários, eles provavelmente eram calmos, pacíficos e intensamente sociáveis a maior parte do tempo.
Afastar-se do homem das cavernas saqueador de Hobbe é mais uma daquelas fabulosas "quebras de paradigma" que acontecem às vezes na ciência, e que viram tudo de cabeça para baixo por algumas décadas (ou séculos, se houver igrejas envolvidas), até que estejamos todos na mesma página novamente – lembre-se de Copérnico e sua ideia absurda de que "a Terra não é o centro do universo".
Interessantemente, como consequência desta reformulação sobre a qualidade de vida na pré-história, está ficando claro que, durante toda a existência humana, exceto a fatia mais recente, os seres humanos foram não-monogâmicos. Os adultos aparentemente não formavam pares exclusivos de casais, como todos nossos livros ditam. Eles não se limitavam a ter filhos com um único parceiro, como a maioria das pessoas faz (ou tenta fazer, ou pensa que devem tentar fazer) hoje em dia.
Nossos parentes mais próximos, chimpanzés e bonobos, são ambos altamente "promíscuos", de acordo com os padrões predominantes da sociedade humana atual. Conforme o psicólogo evolucionário e autor Christopher Ryan, em seu livro Sex At Dawn (Sexo ao amanhecer):
Se você passar algum tempo com os primatas mais próximos dos seres humanos, verá fêmeas chimpanzés tendo dúzias de relações sexuais diariamente, com a maioria ou todos os machos dispostos, e sexo grupal desenfreado entre bonobos, deixando todos relaxados e sustentando suas complexas relações sociais.
Ryan reuniu uma montanha de evidências que dificultam encontrarmos razões convincentes para que continuemos sustentando a ideia de que somos biologicamente orientados para monogamia. Isto simplesmente não faz muito sentido. O único primata que claramente demonstra um comportamento monogâmico é o gibão, uma criatura altamente anti-social que vive em pequenos núcleos familiares, afastados de outros gibões pelos seus enormes territórios. Eles não fazem sexo frequentemente e não aparentam fazê-lo por diversão.
A visão obscura de Hobbe sobre nossos ancestrais tem sido largamente desbancada por todos os campos do mundo antropológico, mesmo os que têm uma opinião fortemente diferente em outros assuntos. Sabemos que eles provavelmente não viviam em ambientes altamente competitivos e orientados à escassez, e que tinham mais tempo dedicado ao lazer do que nós temos.
E sabemos que eles faziam muito sexo picante. Provavelmente mais do que você. Eles definitivamente não eram como os puritanos que surgiram nos últimos séculos, introduzindo cintos de castidade, envolvimento religioso e uma atitude vergonhosa em relação ao sexo.

Por que fazíamos tanto sexo assim?

Antes de mais nada, nós ainda fazemos. Apenas estamos muito mais desatentos a respeito. E não surpreenderia ninguém que a razão primária pela qual fazemos sexo não seja procriar. Fazemos porque nos faz sentir bem física e emocionalmente. Mais especificamente, nos permite compartilhar algo extremamente íntimo com outro ser humano. Na maioria das vezes, estamos definitiva e expressamente tentando não fazer um filho.
De todas as suas experiências sexuais, quantas delas ocorreram simplesmente porque você queria fazer um bebê? A vasta maioria das pessoas usa contraceptivos. Tentamos minimizar a produção de bebês, mas ainda estamos altamente interessados em sexo, o que torna claro que o sexo obviamente tem outro propósito extremamente atraente para os humanos.
Este propósito é de nos aproximar, concretizar laços sociais. Tendo um cérebro grande e um corpo relativamente fraco – um babuíno de 36kg pode despedaçar um homem de 90kg –, o que manteve os humanos vivos por centenas de milhares de anos foi a grande força de seus laços interpessoais.
Que outras espécies se entristecem e se tornam impotentes por tanto tempo, quando perdem um parente ou companheiro? Que outras espécies necessitam de uma década ou duas de atenção constante, para que consigam criar uma criança saudável e independente? Que outra criatura pode perder o controle completamente ao encarar nos olhos um companheiro próximo?
Nós nos vinculamos intensamente, talvez como nenhuma outra criatura jamais o tenha feito. E sexo, em especial o cara-a-cara, pode criar grandes ápices em termos de vínculo íntimo. Nós perdemos nossas pretensões. De uma forma hiper-íntima, ficamos nus para a outra pessoa, externa e internamente ao mesmo tempo.

Antes do "meu" e "seu"

Pense em como seria viver sua vida inteira em um grupo social de cem pessoas. Você conheceria todos bem rápido, e desenvolveria relações com eles durante décadas. Dissidentes e arruaceiros se regenerariam rapidamente ou seriam desprezados – os ciumentos e possessivos também seriam uma responsabilidade muito grande para o grupo todo.
Os seres humanos nunca conseguiram viver sozinhos. Até mesmo hoje, o maior dos medos humanos é de ser banido ou abandonado, pois, por centenas de milhares de anos, isto significou a morte. No mundo civilizado, onde sempre existe outro emprego, sempre existe outro círculo de amigos por aí, rejeição não significa morte, mas emocionalmente ainda é uma experiência devastadora para a maioria de nós.
Notavelmente, não havia a noção de propriedade privada, de "meu" versus "seu". Isto pode ser observado em muitas das tribos de caçadores-coletores remanescentes até hoje, nas quais esconder ou estocar qualquer coisa é visto como flagrante de um delito por toda comunidade.
O comportamento possessivo não era tolerado ou mesmo entendido, portanto a ideia de exclusividade sexual era simplesmente tão absurda e ofensiva para com os outros quanto armazenar comida. É claro que é normal e saudável para seres humanos, se sentirem atraídos por múltiplas pessoas, e nossos ancestrais não teriam encontrado muitas razões para restringir suas atividades íntimas a um companheiro único.
Fêmeas acasalando com múltiplos machos evidenciavam que nenhum macho poderia ter certeza absoluta sobre qual criança era geneticamente sua. Não havia teste de paternidade e todos eram parentes tão próximos que não havia características suficientes nas crianças para distingui-las, tais como cor de cabelo ou dos olhos.
Pense por um momento no significado disso: é como se, durante a maior parte da existência humana, não fosse normal para um homem saber quais crianças eram de fato suas.
Para a sobrevivência do grupo, isso era bom. Antes de tudo, significava que os machos não matariam crianças filhas de outros machos (como ocorre em algumas espécies). Porém, mais importante, significava que todo adulto sentia-se responsável por cuidar de todas as crianças do grupo. As fêmeas amamentavam crianças de outras mulheres, e nenhum homem tinha motivos para ver uma criança como "sua" e outra como "não sua". Todas as crianças eram vulneráveis, todas precisavam de alimento e proteção e amor, e a sobrevivência do grupo dependia da sobrevivência das crianças, independentemente da sua paternidade. Paternidade incerta, como dizem os biólogos, manteve os grupos caçadores-coletores unidos e mais suscetíveis a sobreviver do que seriam, se tivessem se fragmentado em núcleos familiares com preferências claras sobre quem deveria receber mais ajuda.
Portanto, o resultado de uma cultura sexual que as pessoas modernas poderiam chamar de "promíscua" foi que o grupo inteiro era uma enorme família, com uma evidente ausência de alienação, possessividade e competição, se comparado com a nossa forma atual de interação com os outros.

Por que tudo mudou?

Diante de nossos olhos, normas sociais estão mudando. A maioria das pessoas não suspira e cochicha mais ao ver casais inter-raciais. O presidente dos EUA apoiou oficialmente o casamento gay. Hotéis não exigem mais que você seja casado para alugar um quarto com alguém do sexo oposto. O normal muda, e pode mudar rápido.
A monogamia continua a ser aceita pela maioria como "o jeito das coisas serem" entre os seres humanos, em regra geral. Ela está certamente prescrita como algo inegociável na Bíblia e em outros textos religiosos. Mas as relações humanas datam de muito antes deles.
Há mais ou menos dez mil anos atrás, as pessoas descobriram como se estabelecer. Ao invés de vagarem em busca de alimento, elas começaram a cultivar sua própria comida em um mesmo local, ano após ano. Isto causou diversas mudanças imediatamente no mundo todo.
Pela primeira vez, as pessoas podiam ficar em um mesmo lugar. A comida podia ser armazenada e acumulada. Assentamentos tornaram-se permanentes. A população explodiu e as pessoas passaram a viver mais juntas. Moedas foram implementadas. Instituições sociais se formaram: igrejas, leis, forças armadas.
Pela primeira vez, riqueza pode ser acumulada. Uma pessoa podia acumular muitas vezes mais recursos que outra. Nunca antes houve uma forma de alguém se tornar vastamente mais poderoso do que outro, pois grupos nômades só podiam carregar o necessário e procuravam novas pastagens quando os recursos diminuíam. O excesso era inútil.
Mas então todos viram que não havia limites para a acumulação e que, quanto mais acumulavam, mais seguros ficavam. Então ninguém mais sentia que já tinha o bastante – havia sempre o desejo de ter mais. Combine isso com com o crescimento populacional disparando e a competição por recursos se tornou a nova regra.
Isto mudou completamente a dinâmica social entre os seres humanos, em todas as escalas. A existência humana rapidamente passou de um ambiente de abundância para um ambiente de escassez. Grandes desequilíbrios de força e privilégio tiveram início, quando antes eram impossíveis, e eles continuaram a se espalhar pelos últimos dez mil anos.
O que isso tem a ver com sexo?
A maior mudança que a agricultura causou foi fazer com que determinadas pessoas se prendessem a determinadas áreas de terra. A noção de propriedade se tornou crucial pela primeira vez. Quem quisesse sobreviver, ao invés de contribuir para um grupo coeso e autossuficiente, tinha que garantir o direito de trabalhar em determinada área de terras, possivelmente em detrimento dos interesses competitivos de outros. Esta pessoa teria que contribuir como uma fração de uma economia maior e impessoal. Sua vida dependia da sua habilidade para fazer isso.
De forma semelhante com o que ocorre hoje em dia, quando um fazendeiro morria, outros queriam a terra, e a questão de quem teria o direito legal sobre ela tinha que ser resolvida. O procedimento mais intuitivo era que o filho do fazendeiro a herdasse.
Então, pela primeira vez, tornou-se absolutamente necessário para o homem, saber que seus filhos eram seus. Numa época anterior à existência de testes de paternidade e controle de natalidade, só havia um meio do homem ter esta certeza:
Ele precisava estar 100% certo de que sua mulher nunca, jamais fizera sexo com qualquer outro homem.
A partir daí o homem passou a controlar a terra por meio do controle da sexualidade da mulher, e o novo "normal" esculpido por esta tendência econômica permanece como nosso modelo primário até hoje: monogamia sexual. Para se garantirem economicamente, os homens necessitavam de virgens e não toleravam qualquer sinal de não-monogamia. A fidelidade foi fortificada por contratos sociais viciados, incluindo ditames religiosos e crenças culturais, pelas quais as mulheres eram humilhadas, apedrejadas ou pior do que isso, até mesmo por expressarem o desejo de ir para cama com outro homem.
Isto foi o início de uma cultura de desigualdade e repressão sexual com a qual nós, infelizmente, continuamos acostumados. Até mesmo em sociedades progressistas, mulheres que queiram ter diversos parceiros sexuais são frequentemente taxadas de vadias, por ambos os sexos. Homens não são vistos da mesma forma.
Por séculos debateu-se – no meio acadêmico masculino, é claro – se as mulheres poderiam sentir algum prazer no sexo. O consenso no meio acadêmico era de que o sexo era algo voltado apenas aos homens, e era uma mera conveniência para que as mulheres pudessem ter a única coisa que realmente desejam: filhos.
Então parece que a monogamia é um fenômeno cultural que se originou da economia em todos os lugares. Não há necessariamente algo intrinsecamente errado com isso, mas observando os índices de divórcio, não se pode pensar em outra coisa a não ser que isso é um buraco redondo, enquanto os humanos – pelo menos biologicamente – carregam blocos quadrados.
É sabido que na América do Norte, a maioria dos casamentos termina em divórcio, e não por morte, e a maioria dos casamentos inclui infidelidade. Casamentos sem sexo são comuns, mesmo que não seja rotina falar sobre isso.
Ainda estamos nos recuperando de pressões culturais asininas de longa data, que nos dizem que não podemos ter muitos parceiros sexuais, não podemos ser gays, não podemos ser filhos de mãe ou pai solteiros, não podemos fazer sexo grupal sem sermos vistos como pessoas estranhas ou hippies, não podemos ter dois parceiros ao mesmo tempo sem que isso seja traição, e não podemos decidir não ter filhos sem sermos hedonistas egocêntricos.
Felizmente, os famosos estudos de Kinsey, publicados após a guerra, revelaram ao mundo o que ele sempre temia e sabia: que todo mundo estava fazendo tudo o tempo todo, mas apenas não deixando à vista. As pessoas estavam fazendo sexo oral, sexo anal, sexo fora do casamento, sexo grupal, sexo com acessórios, sexo com as próprias mãos e dedos, sexo gay, sexo dress-up, sadomasoquismo e, às vezes, não fazendo sexo.
A variedade e o volume de gostos e prazeres sexuais eram enormes, na realidade, mas publicamente todos apresentavam a mesma faxada: relacionamentos monogâmicos, tementes a Deus e modestos.

De onde vem o normal?

No dia em que nascemos, cada um de nós abre seus olhos e começa a construir um mundo que nos parece "normal". Ele é construído do zero, experiência por experiência, e o que construímos depende de um lance de dados sobre onde nascemos e quando. Então o que consideramos "o jeito que as coisas são" pode ser apenas o jeito como elas têm sido por uns poucos séculos, ou até mesmo décadas e apenas localmente.
Nós temos a tendência de projetar nosso próprio "normal" atrás e adiante no tempo e na vida de milhões de pessoas, considerando muitas pessoas como equivocadas no processo. Ironicamente nos referimos a estas práticas relativamente recentes e a estas regras sociais – das quais a monogamia é apenas uma – como "tradições" e qualquer desvio delas equivale a trair o que é natural. Noventa e nove porcento da existência humana ocorreu antes das formas "tradicionais" sequer existirem.
Eu sei que algumas pessoas que estão lendo não fazem ideia de onde quero chegar com isso ou por que estou abordando monogamia, mas eu sei que muitas pessoas por aí estão acenando positivamente com a cabeça. Deve haver um motivo muito bom para ser tão difícil fazer as coisas funcionarem do jeito "tradicional". O que é tradicional na sua cultura pode colidir fortemente com a sua constituição biológica e emocional.
Eu estive em relacionamentos onde jamais esperavam que eu demonstrasse achar outra mulher atraente. Expor esta verdade era, de alguma forma, errado e ofensivo para minha parceira. Ainda assim, esta é a verdade mais básica e óbvia da sexualidade humana – que sentimos desejo por mais de uma pessoa ao longo de nossas vidas. Mesmo assim, de alguma forma, a perspectiva normal é que a coisa certa a fazer é esconder isso da pessoa que você supostamente mais ama.
Pense em quantas pessoas sofreram das piores dores de coração, só porque não aceitaram esta realidade básica. Se isso for normal, pode ser uma boa razão para não ser normal.
***

Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.
Fotos de sinabeet e GulinKopec.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

O meme da internet mais útil que você já viu para se sentir bem

 Post image for The most useful feel-good internet meme you’ll ever see
Você provavelmente já viu o gráfico acima [se você não o vê, clique aqui], e talvez lhe tenha parecido algo brilhante e que poderia mudar sua vida quando você o viu. É improvável, no entanto, que ele tenha mesmo mudado a sua vida.
 
Os estóicos usavam este mesmo fluxograma desde sempre, e se funcionou para eles é porque eles sabiam quais as habilidades que precisavam para chegar ao grande "Então não se preocupe" (Then don't worry) no centro. E praticavam-nas. Eles achavam que qualquer outra coisa na vida não valia a pena.
 
Este gráfico faz sentido, mas deixa de fora a parte mais difícil. As setas fazer parecer que ir de "se preocupar" para "não se preocupar" é possível com apenas alguns trechos da viagem irrestritos e instantâneos, como se fosse o jogo "Snakes And Arrows", porém sem as cobras.
 
Mas algumas das setas representam habilidades de vida de alto nível que precisam ser identificadas e praticadas se você estiver mesmo a fim de chegar ao cobiçado "Não se preocupe" ali no centro conta própria. Vou explicar passo-a-passo o que realmente seria necessário para ir de um ponto ao outro, não que eu esteja me considerando um especialista em nenhum deles.
 
Mesmo se você não enxergar este mapa como a sua maneira normal particular de agir, todos nós estamos em algum lugar dele em determinado momento, sempre tentando chegar ao meio. Algumas pessoas ficam presas em ponto por dias, semanas ou anos.
 
Eu vou abordar exatamente o que é necessário para colocar este mapa em prática, de forma que ele possa ajudar mais do que ser simplesmente um meme de internet para se sentir bem. Há oito setas sobre as quais irei falar. Aqui estão elas, marcadas com uma caneta vermelha:
 


1
Respondendo se você tem ou não um problema é o passo mais fácil. Se você se sente à vontade, pelo menos neste momento você não tem um problema.
 
Alguns podem argumentar que você pode ter um problema em sua vida e ainda assim se sentir à vontade neste momento. Você pode estar com contas em atraso, sem nenhuma perspectiva de reembolso, mas ainda assim estar cercado por amigos e a vida não está lhe dando problemas.
Eu afirmo que qualquer aspecto de sua situação de vida é apenas uma condição de sua vida, e não se tornará um problema até que ele interfira no seu estado emocional. Em sua vida, sempre haverá algo instável, algo que você ainda não conseguiu assimilar. Mas é difícil chamar isto de problemático se atualmente não exerce um impacto emocional sobre você.
 
Isso não quer dizer que você deva deixar para mais tarde a tarefa de agir frente a situações que não são geradoras de preocupação neste momento. Eu sei que se eu agir agora, quando estou relaxado, o peso sobre mim será menor do que se eu deixar para muito mais tarde quando já estiver estressado com outras coisas. Eu agi antes mesmo disso se tornar um problema. Você pode estar em um estado despreocupado e ainda assim agir preventivamente, para estar melhor preparado contra os estados de preocupação que podem aparecer mais adiante.
 
Então, se você se sente preocupado, a resposta à pergunta é "Sim." Avance para o 3.
 

2

Se você não tem preocupações no momento, então a vida é boa. Você desliza para baixo pela seta 2 para o Santo Graal de toda a vida humana, que é um senso de centralização e ausência de sofrimento. Cada coisa que os seres humanos fazem é, em última análise para chegar aqui. Parabéns! Espero que você permaneça aqui.
 

3

A seta 3 pode ser vencida rapidamente. Se você sente ansiedade (conhecido como dukkha, para os curiosos sobre budismo), então você tem um problema.
 
Parece que todo mundo passa automaticamente da seta 3 para a seta 4, mas é perfeitamente possível ficar preso na seta 3. Você pode perceber que não livre de problemas, mas ainda assim insistir que o problema não é seu, mas de outra pessoa.
 
Um homem poderia dizer "Minha esposa tem um problema: ela nunca escuta o que eu digo." O problema é dele, mas pelo fato de ele atribuir a culpa a outra pessoa, ele pode não reconhecer o problema como seu. Assim, ele nunca vai assumir a responsabilidade para si, nunca fará nada sobre isso, exceto queixar-se, e nunca chegará ao centro do mapa.
 
Se você admitir que o problema é seu, mesmo se você não admitir que a culpa é sua, siga para a seta 4.
 

4

Ok, você já admitiu que tem um problema, e que ele é seu. Agora você se encontra em uma posição mais poderosa do que os reclamadores crônicos presos na seta 3. "Você pode fazer algo sobre isso?" (Can you do something about it?) não é a mais simples das questões e talvez não seja a melhor forma de perguntar. Há uma coisa que você sempre pode fazer para entrar em um estado de despreocupação: suicidar-se. Mas esta geralmente não é uma opção praticável.
 
"Há alguma coisa sensata que você pode fazer que poderia aliviar estas preocupações?" é uma pergunta melhor, mas você não vai se sentir inclinado a se perguntar isso se você ainda não identificou o problema como seu. Nosso marido reclamante da seta 3 não se perguntar isso, porque em sua mente a única ação a ser tomada é a de sua esposa.

Para ir adiante a partir daqui, para 5 ou 6, você deve pensar sobre o que poderia causar alguma mudança sobre a condição que está lhe preocupando. Você precisa ter uma ideia honesta do que é capaz, o que seria muito custoso, qual a sua força e qual não é.

Você pode chegar à conclusão de que não há nada prático que possa ser feito, e a condição que liberaria as preocupações terá que permanecer até que outra pessoa ou deus ex machina a conserte, ou até que ela naturalmente se torne algo com o que você não se importe mais.

E é claro que isso acontece. De fato, de todas as dezenas de milhares de preocupações que você já teve, em algum momento todas se foram, exceto algumas ainda ativas. A maioria se foi sem que você tenha precisado fazer qualquer coisa.

Se você chegar à conclusão de que não há nada que pode fazer, siga para o 5. Senão, siga para o 6. Se você não chegar a conclusão nenhuma, então fique aqui para o resto de sua vida.
 

5

A maioria das preocupações, se você se ativer a ver através delas, seguirá este caminho. Você não fará nada à respeito delas.

Muito frequentemente elas se tornam irrelevantes por conta própria. Você pode ter se preocupado com o que iria dizer quando seu chefe percebesse seu erro, e ele nunca se manifestou, ou então se manifestou rindo do ocorrido. Houve preocupação, você não tomou nenhuma atitude e o estouro que você temia nunca ocorreu.

É seguro afirmar que, independentemente de quem você seja, a maioria das coisas com as quais você se preocupa jamais acontecem.

Outras vezes suas preocupações se tornam realidade. Exatamente como você temia, você é reprimido, constrangido, abusado ou ignorado. E você sobreviveu, como todas as outras vezes.

Devo ressaltar que preocupar-se com um acontecimento antes de ele realmente acontecer não o tornou nada mais prazeroso para você. Preocupação não o protegerá de nada, mas apenas lhe indicará o momento em que alguma atenção racional pode ser necessária em sua vida.

Note que você não precisa decidir conscientemente que não fará nada sobre o problema em questão para que ele seja dirimido por conta própria. Mesmo assim, foi isso que aconteceu. Na verdade é muito raro que uma pessoa decida conscientemente que não fará "nada". Se você nunca fez isso, acredite: isso pode lhe fazer sentir muito bem.

Somente se você ativamente se comprometeu a "fazer nada" em resposta a uma preocupação que teve, você pode seguir para seta 8, o último trecho antes da despreocupação completa. Caso contrário, você se preocupará agora mesmo com a próxima etapa.
 

6

Ok, há algo que você pode fazer. Você tem um problema, o reconheceu como sendo seu e vê que há algo que pode fazer a respeito. Mas você não está nem na metade do caminho.

Apenas dar-se conta de que há algo que você pode fazer não alterará seu estado de preocupação. Comprometer-se a fazer alguma coisa é o que aliviará sua preocupação. Prossiga para seta 7.
 

7

Assim que você conclui que “Sim, eu posso fazer algo a respeito”, você finalmente está direcionado ao Santo Graal. Mas apenas se você realmente estiver decidido, quando diz "Sim".

Esta é a segunda seta mais difícil de lidar, pois para que o mapa funcione completamente, você tem que vencer este trecho. E isto significa que você terá que contar consigo mesmo para fazer o que tem que ser feito.

Isto se chama disciplina e parece haver uma severa minoria de pessoas que se descreveria como bem disciplinados. Portanto, aqui não é um mau lugar para se tornar excepcional.

Disciplina é a habilidade de colocar-se em ação independentemente de seu estado emocional. Você ainda estará em meio a preocupações neste ponto e deve saber como fazer seu corpo e sua boca se moverem mesmo que você ainda não esteja totalmente confortável.

A utilidade deste mapa está intimamente ligada à disciplina. Se você não consegue lidar com este detalhe, não há como chegar ao "Não se preocupe". Você pode apenas esperar que as coisas se resolvam por si próprias. É isto que eu tenho feito na maioria dos casos durante a minha vida e, de forma geral, funciona.
 

8

Este passo é o mais difícil de todos, pois é onde você transforma um problema em um não-problema. Você não o resolveu e não vai resolvê-lo. Pode até ser impossível de resolver. Pode ter implicações pelo resto de sua vida. Mas lembre-se: o que faz de um problema, um problema é o que ele causa em você emocionalmente.

Se a situação permanece, suas emoções tentarão abalar a paz. Elas tentarão fazer você reclamar, desejar e ter esperanças. Elas tentarão colocar você em um cenário que não está acontecendo — um mundo bizarro onde não há desvantagem que você possa ser forçado a aceitar, nenhuma dor com a qual você terá que lidar.

Geralmente algo acontece em nossas vidas e reagimos emocionalmente com algum tipo de "Isto não pode estar acontecendo!" Então eventualmente, se não desaparece por si próprio, nós superamos e aquilo deixa de parecer um problema. Este é um processo de três etapas, que já aconteceu cinquenta mil vezes na sua vida, e é apenas o passo do meio que faz você sofrer.

A seta 8 é a grande sacada dos muito inteligentes e muito hábeis. Eles sabem como ignorar ou minimizar este passo do meio — a explosão altamente emocional num "Isto não pode estar acontecendo!", o qual nada mais é do qeu um protesto irracional contra nós mesmos. Os inteligentes vão rapidamente do acontecimento à assimilação deste. É necessária somente a decisão de não fazer nada (obtida na seta 5) e um comprometimento em dar boas vindas a o que quer que aconteça, como se tivessem escolhido que acontecesse.

Krishnamurti falava exatamente disso. Para ele, isto era a única ação sensata a se tomar: envolver-se com o que acontecesse como se o fato não fosse de forma alguma indesejável. Desta forma você se livra da dor de resistir à realidade e ainda tem uma opção sobre agir ou não em resposta. Ele viveu comprometido com o "não se importe com o que acontecer".

Quer ele eventualmente tomasse o caminho da seta 5 ou da seta 6 para chegar ao estado de despreocupação total, ele acabaria neste estado de qualquer maneira, a menos que se recusasse a ou fazer o necessário para que a mudança ocorresse (seta 7) ou aceitar a realidade como ela se apresenta (seta 8).

Se eu sou bom nisso? É claro que não. Mas não importa o quão mal nisso eu seja, isso realmente me ajuda a identificar a seta na qual eu estou trancado. É uma questão de eu não ver o problema como sendo meu, de eu não decidir se posso ou não fazer algo a respeito ou se sou muito preguiçoso ou medroso para fazê-lo? Certamente isso clareia muito diversos dilemas.

Espero que você tenha ficado excitado quando viu o gráfico "Não se preocupe" no Facebook ou no Stubleupon (ou outro lugar). Chegar ao "Não se preocupe" parece complicado, mas não é. É apenas difícil.

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Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude.