quinta-feira, 15 de março de 2012

Por que o seu trabalho o decepciona

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Apenas uma rápida palavra sobre determinado assunto. Se você cria algo como hobby ou trabalho – escrito, artes visuais, música, qualquer coisa – eu acho que isto significará alguma coisa para você. Se você criava e não faz mais, então isto pode ser ainda mais relevante.
Eu não me lembro onde eu vi pela primeira vez mas isto tem sido algo recorrente nos canais sociais de mídia:
"Ninguém conta isto para iniciantes, eu gostaria que alguém tivesse me contado. Todos nós que temos um trabalho criativo, começamos a fazê-lo porque temos bom gosto. Mas aí existe uma lacuna. Durante os primeiros anos, o que você cria, simplesmente não é tão bom. Está tentando ser bom, tem potencial, mas não é. Mas o seu gosto, o motivo que fez você entrar no jogo, continua matador. E o seu gosto é a razão do seu trabalho o desapontar. Muitas pessoas desistem nesta fase. Muitas das pessoas que conheço e que possuem um trabalho interessante e criativo passaram anos por isso. Nós sabemos que o nosso trabalho não possui aquele detalhe especial, o qual queremos que ele tenha. Nós todos passamos por isso. E se você está começando algo ou está nesta fase, você precisa saber que isto é normal e a coisa mais importante que você pode fazer é produzir um monte de trabalhos. Trabalhe com um prazo de modo que toda a semana você termine uma história. Somente através de muito trabalho você irá preencher aquela lacuna e o seu trabalho será tão bom quanto sua ambição. E eu levei mais tempo para descobrir isso do que todas as pessoas que encontrei. Isso levará tempo. É normal que leve um tempo. Você só precisa trilhar o seu caminho através disso." – Ira Glass
Seu gosto é a razão pela qual seu trabalho o desaponta.
Eu acho que isto é um fato da vida para pessoas criativas e nós deveríamos estar aliviados por tudo o que explica. É por isso que pode ser tão difícil sentar em uma cadeira e produzir alguma coisa – é doloroso criar algo que não atinge os seus padrões, e todos nós que somos novos em nossas respectivas artes, com frequência não atingimos as metas que idealizamos.
Isto também explica como escritores e músicos realmente sem talento são mais confiantes e menos inibidos acerca de autopromoção do que os talentosos. Baixos padrões alcançam-se facilmente. Se você é consciente sobre expor o seu trabalho, bom, existe uma razão para isto. Péssimos artistas são ruins porque eles não sabem com que o "bom" se parece. Isto explica o porquê de as pessoas desistirem, mesmo quando enxergaram o quão bom poderiam vir a ser.
A lacuna de habilidade paladar parece ser uma lei imutável do ofício em si e aqueles que tomarem parte nisso irão sofrer dela de alguma forma quase sempre que se acomodarem, ao menos enquanto eles não souberem disto. Fazendo uma retrospectiva, isto é óbvio, mas nunca tinha me ocorrido até eu dar de cara com esta citação alguns meses atrás.
Mesmo sendo uma revelação tão grande, eu a esqueço o tempo todo. Eu esqueço que a maior parte da autotortura que conhecidamente acompanha o trabalho criativo deriva daquele abismo que existe entre o gosto e a habilidade artística, e ele tem todos os motivos para existir. Sentimentos habituais de "eu sou péssimo nisto" não são uma falha, nem uma tragédia particular ou algum tipo de sinal, mas sim que você sabe o que é bom e o que não é.
Então isto é mais um daqueles pontos de natural inquietação na vida humana, em que a nossa melhor escolha é desafiar a nossa inclinação natural como uma questão de hábito e criar, mesmo que isto nos machuque ou nos assuste. "Quando é o melhor momento para praticar?" um estudante perguntou para Dalai Lama. "Quando você achar que não é" ele disse.
Esta não é a mais atraente revelação, mas ela facilita a compreensão de que trabalho ruim é a) normal e b) necessário. O volume de trabalho que Glass refere-se não irá mudar. Só é necessário entrar nele e atravessá-lo, e grande parte dele não será muito boa. Isto não se encaixa naturalmente na minha estratégia normal de evitar tudo o que possa fazer com que eu me sinta mal. Eu não tenho certeza de como isso está afetando a sua vida criativa, mas eu me sinto confiante de que o meu mistério tem companhia.
Hipoteticamente, então, a mentalidade mais saudável para aproximar-se do trabalho seria fazer duas coisas: Primeira: acolher o trabalho ruim quando ele vier – amar ele como amamos crianças arruaceiras só por serem nossas e sem considerar como os outros irão insultá-las. E segundo: sentar e fazer algo com maior frequência, porque nós entendemos que, fazendo uma porcaria bem intencionada, seremos conduzidos ao topo da montanha tão rapidamente quanto nos conduziriam ataques de brilhantismo.
A lacuna de Glass me lembrou de uma antiga metáfora sobre escrever. É como garimpar ouro. Apenas escolhendo palavras, você está procurando por ouro e a maior parte será areia. Mas existem sinais de ouro lá. Você não pode fazer outra coisa a não ser ficar bom nisso e logo não precisará passar por tanta areia. Porém a areia é normal. Ela não deveria preocupar você, não deveria irritá-lo tanto e definitivamente não deveria lhe convencer de que você está procurando no lugar errado.
Hoje (15/03/2012) é o terceiro aniversário do Raptitude. Eu sinto como se sempre tivesse feito isso, escrever, mas isso é realmente novo para mim. Ainda sou uma criança novinha. E isto é um alívio.
Tudo o que estou tentando dizer aqui, ao meus colegas criativos, é que levará um tempo antes de nós sermos bons o suficiente para nós mesmos, mas nós não chegaremos perto sem produzir mais trabalho.
E às vezes atividades criativas são solitárias. Mas você não está sozinho. Nós todos compartilhamos disso. Todos nós batemos nossas cabeças no mesmo muro. Ninguém entenderá completamente o porquê de fazermos isto. Eles não estarão interessados na nossa "areia", e eles provavelmente não entenderão que a areia é uma parte necessária do processo.
Mas nós devemos saber disto.
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Foto de PHOTONQ
Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude, realizada por Moisés Boff e revisada por Alexandre Heitor Schmidt.

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