domingo, 4 de dezembro de 2016

Cinco coisas que você percebe quando abandona os noticiários

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Eu cresci acreditando que acompanhar os noticiários faz de você um cidadão melhor. Oito anos após tê-los abandonado, essa ideia agora soa ridícula - que consumir diariamente um produto de informação particularmente inimaginável, de alguma forma, faz de você um pensador e o deixa informado de uma forma que beneficie a sociedade.
Mas eu ainda encontro pessoas que se opõem à possibilidade de um adulto inteligente e engajado abandonar os noticiários diários.
Para ser claro, eu estou falando principalmente sobre acompanhar as notícias da TV e da internet. Esta postagem não é uma acusação ao jornalismo como um todo. Há uma grande diferença entre assistir por meia hora a cobertura da crise de refugiados na CNN (não que eles ainda estejam noticiando isso) versus passar esse tempo lendo um artigo de 5.000 palavras sobre o mesmo tópico.
Se você abandoná-lo, mesmo que por apenas algo em torno de um mês, o hábito de assistir noticiários pode começar a se tornar desprazeiroso e desnecessário para você, de forma não muito diferente do fumante que se dá conta de como o tabaco faz as coisas cheirarem mal, assim que ele para de acender seu cigarro.
Algumas coisas que você pode notar, se der um tempo:
1) Você se sente melhor
Um sintoma comum ao abandonar os noticiários é uma melhoria no seu humor. Viciados em noticiários dirão que é porque você enterrou sua cabeça na areia.
Mas isso pressupõe que assistir a noticiários seja equivalente a ter sua cabeça exposta ao ar puro e fresco. Eles não se dão conta de que sua percepção sobre o mundo a partir das notícias não chega nem perto de uma amostra representativa do que está de fato acontecendo no mundo.
Os noticiários não estão interessados em criar uma amostra precisa. Eles selecionam o que 1) é incomum, 2) é horrível e 3) provavelmente venha a se tornar popular. Então a ideia de que você possa ter uma noção significativa da "situação mundial" assistindo aos noticiários é absurda.
As seleções deles exploram nosso viés negativo. Nós evoluímos para prestar mais atenção ao que é assustador e enfurecedor, mas isso não significa que toda instância de medo ou raiva seja útil. Depois que você para de assistir, torna-se óbvio que é um objetivo primário das reportagens - e não um efeito colateral secundário - agitar e desanimar o espectador.
O que aparece nas notícias não é "O portfólio de preocupações da pessoa conscienciosa". O que aparece é qualquer coisa que venda, e o que vende é medo, bem como desprezo por outros grupos de pessoas.
Construa seu próprio portfólio. Você pode obter melhores informações sobre o mundo a partir de fontes mais aprofundadas, que tenham levado mais de metade de um dia para serem agrupadas.
2) Você nunca esteve realmente se aperfeiçoando em nada por assistir às notícias
Se você perguntar a alguém o que ganha assistindo notícias, você vai ouvir noções vagas como: "É o nosso dever cívico para ficar informado!" ou "Eu preciso saber o que está acontecendo no mundo", ou "Não podemos apenas ignorar estas questões", nenhuma das quais responde à pergunta.
"Estar informado" soa como uma realização, mas qualquer informação faz isso. Você pode se tornar informado lendo uma planilha com os horários do ônibus.
Um mês depois de você ter parado com os noticiários, é difícil citar qualquer coisa útil que tenha sido perdida. Torna-se claro que esses anos assistindo notícias não representam praticamente nada em termos de melhoria de sua qualidade de vida, conhecimento duradouro ou sua capacidade de ajudar os outros. E isso sem falar no custo de oportunidade. Imagine se você tivesse passado esse tempo aprendendo uma língua, ou lendo livros e ensaios sobre algumas das questões que eles mencionam nas notícias.
Você verá que sua abstinência não resultou em reuniões de gabinete piores do que as que já estavam sendo feitas, e que os esforços de ajuda em desastre continuaram sem o seu envolvimento, como sempre. E no fim das contas, seu hobby de monitorar o "estado do mundo" de fato não afetou o mundo.
Nós herdamos de algum lugar - talvez da época em que havia apenas uma hora de notícias disponíveis por dia - a crença de que ter uma noção superficial sobre as questões mais populares do dia é de alguma forma útil para aqueles mais afetados por elas.
3) A maioria das conversas relacionadas a eventos atuais são apenas pessoas falando a partir de seus traseiros
"Porque ajuda você a participar de conversas diárias!" é uma resposta fraca, mas pelo menos significativa, à pergunta "O que você ganha?". Mas quando você para de jogar o jogo dos eventos atuais e passa a observar os outros falando sobre eles, você percebe que quase ninguém realmente sabe do que está falando.
Há um abismo extraordinário entre ter uma compreensão funcional de um problema e o olhar superficial que você recebe dos noticiários. Se você se deparar com uma conversa do tipo 'quebra-gelo' a respeito de um tópico sobre o qual você tem muito conhecimento, você vê exatamente "através das roupas do imperador" (https://pt.wikipedia.org/wiki/A_Roupa_Nova_do_Rei). É meio hilária a determinação das pessoas para falar corajosamente sobre questões que conheceram há nem três horas.
Fazer observações contundentes e tomar posturas rígidas, mesmo que equivocadas, faz a pessoa se sentir bem, e os noticiários nos dão o alimento perfeito para isso. Quanto menos você sabe sobre um problema, mais fácil é fazer proclamações ousadas sobre ele, porque, visto à distância em que é apresentado no noticiário, ainda parece claro o suficiente para que você tenha certeza sobre o que deve acontecer na sequência.
Talvez a última coisa que o mundo precise é de outro debate sobre a Questão X entre duas pessoas que aprenderam sobre isso a partir de um noticiário - pelo menos se estamos tentando melhorar as relações entre pessoas de diferentes grupos.
4) Há maneiras muito melhores de se "estar informado"
Todos nós queremos viver em uma sociedade bem informada. Os noticiários informam, sim, as pessoas, mas eu não acho que façam isso bem.
Existe uma infinidade de fontes de "informação". A parte traseira do seu xampu contém informação. Hoje há muito mais informação por aí do que podemos absorver, então temos que escolher o que merece o nosso tempo. Os noticiários fornecem informações em volume infinito, mas profundidade muito limitada, e são claramente destinados a agitar-nos mais do que educar-nos.
Cada minuto gasto assistindo notícias é um minuto que você está indisponível para aprender sobre o mundo de outras maneiras. Os americanos provavelmente assistem a cem milhões de horas de cobertura de notícias todos os dias. Isso equivale a um monte de livros não lidos, para citar um exemplo comparativo.
Leia três livros sobre um tema e você sabe mais sobre ele do que 99% do mundo. Assista às notícias o dia inteiro por anos e você tem uma consciência distante e de nível "quebra-gelo" sobre milhares de histórias, pelo menos pelas poucas semanas durante as quais elas sejam populares.
Se apenas nos preocupamos com a amplitude da informação, e não com a profundidade, não há muita distinção entre "ficar informado" e ficar desinformado.
5) "Estar preocupado" nos faz sentir que estamos fazendo algo quando não estamos
Noticiários se resumem a injustiça e a catástrofe, e naturalmente nós sentimos incômodo ignorando histórias nas quais povos estão sendo feridos. Por mais superficiais que os noticiários de TV possam ser, os problemas relatados neles são (em geral) reais. Muito mais reais do que eles jamais serão através de uma televisão. As pessoas estão sofrendo e morrendo, o tempo todo, e ignorar uma descrição de qualquer desses sofrimentos, até mesmo uma descrição cínica e manipuladora, nos faz sentir culpados.
O mínimo que podemos fazer é não ignorar, pensamos. Assim nós assistimos na TV, com olhos molhados e sensação de nó em nossas gargantas. Mas ficar neste nível de "preocupado" não está realmente ajudando ninguém, exceto talvez para aliviar um pouco da nossa própria sensação de culpa.
E eu me pergunto se há aqui algum tipo de "efeito substitutivo" em ação. O senso de "pelo menos eu me importo" pode realmente nos impedir de fazer algo concreto para ajudar, porque assistindo de forma complacente não temos realmente que enfrentar a realidade de que não estamos fazendo absolutamente nada sobre isso.
Assistir desastres se desdobrarem, mesmo enquanto não fazemos nada, pelo menos nos faz sentir um pouco mais compassivos do que se desligarmos a TV. A verdade é que a grande maioria de nós não irá fornecer absolutamente nenhuma ajuda para as vítimas de quase todas as atrocidades que acontecem neste mundo, sejam elas televisionadas ou não. E isso é difícil de aceitar. Mas se pelo menos pudermos mostrar preocupação, mesmo que para nós mesmos, não as teremos aceitado passivamente. Podemos permanecer não envolvidos, sem nos sentirmos não envolvidos.
Esta pode ser a maior razão pela qual tenhamos medo de desligar os noticiários. E pode ser a melhor razão para fazê-lo.
Você abandonou os noticiários? O que você percebeu?
***
IMAGEM POR MIKE LICHT
Esta é uma tradução livre do artigo de David Cain, no Raptitude, realizada por Alexandre Heitor Schmidt.

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